Hoje às 04h00, me despertei com ela, dei um trago na água ao lado da cama
(vazia), fiz um café instantâneo com canela, e passei a mão na revista 'Babel
Poética', EU # OUTRO, do escritor paranaense/santista e também editor dessa revista, Ademir Demarchi.
Como de costume,
sempre tenho a esperança de que, se começar a ler, a in Sônia dorme, e me aproveito disso, mas não foi assim.
Acendi o abajur, aleatóriamente abri a Babel e veio à página 40, um poema de Fabio Weintraub (SP),
“OUTRO”
Desejo enorme
De não ser este
Portar outros gestos
Vestir noutro dedo
O anel alheio
De ter outra casa noutra cidade
Assinar cheques
Com outro nome outra letra
Desejo
De outras silabas
Outros beijos
Outra mão a afagar
Outros cabelos
Noutro espelho
Outra barba
Pontilhando o rosto
O queixo
Sob outra luz
Outro cheiro
Noutro quarto
Sem cadeira
Sob o nó da forca
Sem o copo de veneno
Lá em cima do piano
Onde não pude ser ninguém
Coisa que se fixa
Como ideia clara
Desejo de outro hotel
Outra bagagem
E digitais restauradas como quem lava
as mãos
E apaga
O fogo de quem foi
Franjinha sebosa se levanta
Do banco onde está
E vem senta-se ao meu lado
No ônibus vazio
Talvez seja secretaria
Talvez preencha boletos ou monitore
As entregas dos motoboys
Talvez lave a franja
Duas vezes por semana
Coma pizza em dias alternados
Tenha um gato e se masturbe
Quando a novela não acaba
Tão logo toma assento
Cerra os olhos cabeceia
Tenho medo de que babe
Perca o equilíbrio e desabe
Sobre a minha pessoa
Dedos cruzados
Em posição de prece
Sua postura é bizarra
Ela é devota de algo ou de alguém
E seu sono conta pontos
No placar sombrio de um país
Aonde os versos não chegam
Fabio Weintraub
Diálogo entre EU e o OUTRO:
Eu: __ Dentro do poema, há outro poema.
Outro: __ nas entrelinhas?
Eu: __ Sônia, sua sebosa, vamos dormir!
Outro: __ você escreve mal pra caralho
Eu: __ bom dia, ou melhor, boa noite e bom domingo; tenha bons sonhos...
Tatiana Justel
Nenhum comentário:
Postar um comentário